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Aproximação de Putin e Trump e intransigência de Zelensky podem afastar EUA da Ucrânia, diz analista

Publicado em 19/08/2025 às 15:51
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Em entrevista à Sputnik Brasil, especialista explica que presidente norte-americano deseja que político ucraniano aceite posição negociada por Washington com Moscou. Jogo duro de Kiev poderia fazer republicano virar as costas para o conflito.

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, recebeu, na noite da última segunda-feira (18), uma ligação do seu homólogo norte-americano, Donald Trump, que celebrava uma reunião com líderes europeus e o chefe da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), Mark Rutte. O mandatário de Washington paralisou o encontro para atualizar o líder de Moscou sobre as conversas em relação a um possível fim da crise na Ucrânia.

Segundo o assessor presidencial do Kremlin, Yuri Ushakov, Putin e Trump se mostraram favoráveis à continuidade das negociações diretas entre as delegações da Rússia e da Ucrânia, aumentando possivelmente o nível dos participantes nessas conversas.

"É significativo que Vladimir Putin e Donald Trump tenham concordado em manter contato estreito sobre a Ucrânia e outros temas atuais da agenda internacional e bilateral", disse Ushakov a jornalistas.

Em entrevista à Sputnik Brasil, o analista geopolítico e de conflitos militares Rodolfo Laterza, coautor do livro "Guerra na Ucrânia: análises e perspectivas", disse acreditar que essa aproximação de Putin e Trump indica que o republicano deseja que Vladimir Zelensky aceite os termos já discutidos entre Moscou e Washington. Uma tentativa de braço de ferro de Kiev poderia culminar em uma saída dos norte-americanos das hostilidades no Leste Europeu.

"Uma intransigência do regime de Kiev pode levar Trump a se afastar do conflito e remeter aos europeus todo fardo de sustentação do regime ucraniano."

Segundo Laterza, os pontos defendidos por Trump diante de Zelensky para o fim da operação militar especial russa são: neutralidade permanente da Ucrânia perante a OTAN; reconhecimento da Crimeia e das regiões integradas à Rússia no referendo de 2022; fim das restrições legais e perseguição ao idioma russo e à Igreja Ortodoxa russa; retirada das tropas ucranianas da região de Donbass.

Para que esse acordo de cessar-fogo ou até mesmo de paz seja alcançado, delegações russas e ucranianas devem se reunir para acertar os termos. O presidente dos Estados Unidos, por sua vez, insiste em uma reunião bilateral entre Putin e Zelensky ou até mesmo trilateral. Todavia, o analista não vê real interesse de Kiev em uma solução negociada.

"Ainda não há perspectivas concretas [para paz duradoura], pois as forças beligerantes ainda creem na solução militar e o apoio da OTAN ao regime de Kiev continua em todos os aspectos, principalmente no fornecimento de dados de inteligência, reconhecimento e vigilância essenciais para qualquer planejamento tático-operacional."

Para Laterza, o interesse de Trump em manter Putin informado sobre o que foi conversado passa por uma tentativa do norte-americano de se aproximar dos russos, ao mesmo tempo que busca oferecer um segundo parceiro comercial e diplomático para a Rússia, além da China.

"São acordos geoestratégicos entre as potências para reequilibrar a arquitetura de segurança global e buscar alguma convergência em questões econômicas, como a exploração do Ártico e de terras raras, além de evitar um fortalecimento muito imediato do eixo geoeconômico Rússia-China por parte de Trump. A Ucrânia é um detalhe nessa equação."

Ucrânia sem autonomia

A professora Isabela Gama, da Abu Dhabi University Military College, acredita que as chances de um acordo de paz ou de cessar-fogo continuam fora de questão pela distância das exigências das partes envolvidas no conflito. Entretanto, a especialista não acredita que Kiev tenha condições de decidir pelo próprio destino.

"Não sei se autonomia é algo que a Ucrânia possa desfrutar. E pode soar bastante difícil de explicar isso, até mesmo de conceber, que um Estado não tem soberania. Mas parte da soberania da Ucrânia foi cedida por eles mesmo, por Zelensky, para o Ocidente quando ele decidiu que iria manter esse conflito por tanto tempo, beijando a mão do Ocidente."

Por mais que Gama classifique como importante o estreitamento de laços entre Rússia e Estados Unidos nestes últimos dias, a professora vê diferentes obstáculos para que um cessar-fogo seja alcançado na Ucrânia — principal objetivo defendido por Trump nessas conversas.

"Até o momento, os discursos são demasiadamente vagos, com relação ao que cada um quer. E quando se fala mais diretamente no que cada parte espera de um acordo para um cessar-fogo, são pedidos maximalistas, muito difícil de chegar a um meio-termo."

Gama acredita que muitos Estados-membros da OTAN não priorizam o fim das hostilidades no Leste Europeu e buscam, creditando à Rússia todos os problemas, prolongar o conflito. A analista destaca também que a tentativa de Trump de mediar um acordo pode ser vista como um escanteamento por parte dos países da aliança militar.

"Alguns dos Estados-membros da OTAN estão muito engajados no conflito e, talvez, tenham se sentido deixados de lado nessa tentativa de solucionar o conflito ou escalar. Porque muitos — na minha opinião, a maior parte, na verdade — dos Estados não estão muito integrados nos esforços de terminar o conflito, mas estão escalando."


Por Sputinik Brasil