DO DRONE À INFANTARIA

Brasileiro, recrutado por americano, é enganado por ucranianos e foge para não lutar na linha de frente

Publicado em 22/08/2025 às 19:51
© Sputnik

Em entrevista à Sputnik Brasil, o paranaense Lucas Felype Vieira revelou que viajou até a Europa para trabalhar com drones, mas se viu obrigado a lutar junto da infantaria ucraniana por supostos erros burocráticas. Agora, jovem de 20 anos busca recomeçar a vida no Velho Continente, mas longe de Kiev.

O brasileiro Lucas Felype Vieira, de 20 anos, ficou conhecido nacionalmente após um vídeo de desabafo viralizar nas redes sociais. O jovem de Francisco Beltrão, cidade no interior do Paraná com pouco mais de 100 mil habitantes, foi seduzido pela oportunidade de trabalhar com tecnologia militar na Ucrânia, mas chegando ao país recebeu uma arma e foi enviado para próximo da linha de frente do confronto com a Rússia.

O vídeo, que alcançou milhões de visualizações nas redes sociais desde o fim de julho, mostra um Lucas desesperado e desacreditado. Após atravessar o oceano para se especializar em drones, como havia sido prometido por um recrutador norte-americano e, posteriormente, por ucranianos, o brasileiro se via cada vez mais perto de explosões, tanques e tiros.

Cerca de um mês após a publicação viral, o paranaense conseguiu deixar a Ucrânia e chegou à Espanha. Em uma entrevista exclusiva à Sputnik Brasil, Lucas, que não quis revelar, por questões de segurança, em qual cidade está ou como chegou até lá, contou como a oportunidade de ser um mercenário ucraniano surgiu.

"Vi um vídeo em rede social mesmo, de recrutamento, da própria Ucrânia, falando sobre a Legião Internacional. E, pesquisando melhor, vi também que não tinha vaga só para artilharia, infantaria, como também para a área técnica, drones, que eu estava bastante interessado."
Lucas Felype Vieira, de 20 anos, conseguiu fugir da Ucrânia após promessas falsas para ser mercenário no país
Lucas Felype Vieira, de 20 anos, conseguiu fugir da Ucrânia após promessas falsas para ser mercenário no país

Lucas se deparou com este anúncio para ser mercenário logo após perder a mãe, com quem morava sozinho. Em um momento delicado e trabalhando em uma área que não o despertava interesse, o jovem viu na oportunidade de participar de um conflito uma chance de ressignificar a vida.

"No fim do ano passado, acabei perdendo a minha mãe. Vivia só eu e ela. Eu comecei a entrar em um… Como posso explicar? Comecei a questionar [a vida], sabe? Qual era o sentido da vida? O que eu queria para minha vida? Então, a oportunidade de entrar aqui [Legião Internacional] me pareceu perfeita para me sentir vivo, para viver mesmo, e não só trabalhar, trabalhar, trabalhar."

Um primeiro contato por e-mail, em seguida conversas no aplicativo de mensagem Signal, e pouco tempo depois foi a hora de sair de casa em direção à Europa.

Quando a expectativa encontra a realidade

Com a promessa de se desenvolver no campo de tecnologia militar e com um salário mensal de US$ 400 dólares (cerca de R$ 2.160), Lucas arcou com todas as despesas para ir até a Ucrânia — mais de R$ 23 mil. O jovem voou do Brasil para a Polônia, por onde atravessou a fronteira andando para o território ucraniano.

Ao se apresentar à Legião Internacional, o paranaense passou por um treinamento intensivo de um mês, no qual aprendeu técnicas de combate em classes ministradas em inglês. Lucas explica que não tinha experiência militar e que esse foi o seu primeiro contato com armas, e reforça que em nenhum momento durante o processo de recrutamento indicou que gostaria de ir ao campo de batalha.

"A gente tem um formulário de interesse, faz um resumo básico sobre o nosso perfil. Enfim, tudo que escrevi, assinalei no formulário, estava mais para a área técnica, e que eu não tinha muita aptidão física para o treinamento militar."

Por mais que tenha achado o treinamento ucraniano muito rápido, Lucas estava animado para finalmente poder aprender mais sobre drones. Foi então que ele descobriu que um suposto erro no formulário de inscrição o indicava para a infantaria na região de Carcóvia e não para operações com tecnologia.

O brasileiro tentou pedir transferência, conversar com superiores, mas nada era suficiente para tirá-lo daquela situação.

"No dia que postei o primeiro vídeo, foi quando já estava praticamente batendo boca com meu líder, falando que não era isso que queria, que tinha ido com outro propósito, só que, mesmo assim, eles só falaram que não podiam fazer nada e que tinha que seguir o processo."

Sem ter para onde ir ou a quem recorrer, Lucas se deparou com a dura realidade de um conflito entre nações, algo que não é comum para um brasileiro. Sons de explosões, voo constante de aeronaves militares e até comida ruim chamaram a atenção dele. Nada parecia com o que o paranaense imaginou ao deixar Francisco Beltrão.

"É um choque no começo, mas depois você acostuma. Querendo ou não, no geral, estava me sentindo de mãos atadas, sabe? A situação onde eu me encontrava estava muito longe do meu controle."

Vendo colegas que deram boas-vindas a ele sendo capturados, Lucas decidiu fugir. Sem contar como conseguiu deixar a Carcóvia e chegar até a Espanha, o jovem apenas celebra estar longe da Ucrânia, mesmo que sem ajuda do Brasil para deixar aquela situação.

"O consulado [brasileiro] na Ucrânia falou que não se mete nos assuntos de interesse das Forças Armadas da Ucrânia, mas teve outros setores também, outros órgãos do Brasil, que pedi ajuda, mas não teve evolução no caso."

Latinos são maioria entre mercenários

Lucas contou que muitos dos seus companheiros na Legião Internacional eram latino-americanos, provenientes, na maior parte das vezes, da Colômbia. Ainda segundo o jovem, a maioria deles já possuía treinamento com armas e fazia parte de grupos paramilitares, os quais ele não soube nomear.

Entre os brasileiros, Lucas afirmou que a maioria era paranaense com passagem pelas Forças Armadas do país, mas não soube explicar o motivo. Coincidência ou não, a maior colônia ucraniana no Brasil fica, justamente, no Paraná.

Apesar de estar na Europa sozinho, Lucas conta com o apoio da família daqui do Brasil. Eles o incentivam a buscar uma vida melhor no Velho Continente.


Por Sputinik Brasil