OTAN

Análise: negociações sobre Ucrânia serão infrutíferas se não incluírem neutralidade e renúncia à OTAN

Por Por Sputinik Brasil Publicado em 05/09/2025 às 18:03
© AP Photo / Ian Langsdon

O atual conflito na Ucrânia, iniciado em 2022, continua a ser um dos maiores desafios geopolíticos do século XXI, com suas ramificações afetando não apenas a Europa, mas o equilíbrio global de poder.

Em entrevista à Sputnik Brasil, o especialista em relações internacionais Tito Lívio compartilhou sua visão sobre as origens do conflito, as razões que levaram à escalada de tensões entre a Rússia e a Ucrânia, e o impacto das sanções e da resistência da Rússia no cenário mundial.

Ao longo da conversa, Lívio abordou questões cruciais, como o papel da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), a estratégia militar russa, e as diferentes posturas adotadas pelas potências globais diante do conflito. Para o analista, o que está em jogo não é apenas o futuro da Ucrânia, mas a reconfiguração da segurança europeia e atlântica em um mundo cada vez mais multipolar.

Segundo Lívio, a crise entre a Rússia e a Ucrânia não é uma simples disputa territorial, mas um reflexo de um longo processo de tensões em torno da expansão da OTAN e da aproximação da Ucrânia com o Ocidente.

Lívio afirmou que "os problemas entre a Rússia e a Ucrânia não se originaram exatamente em 2022", e que é necessário traçar o histórico da crise "pelo menos desde 2014". Ele explicou que a Ucrânia, com seu alinhamento pró-europeu e o desejo explícito de se integrar à OTAN, passou a ser vista como uma ameaça para Moscou. "O problema não é a integração com a União Europeia, isso nunca foi tabu para a Rússia", destacou. "O problema é se integrar a uma aliança militar, que foi instituída na Guerra Fria", completou.

Para ele, o real temor de Moscou está na possibilidade de que, ao se integrar à OTAN, a Ucrânia traga para o seu território toda a infraestrutura militar dos países-membros. Lívio fez uma analogia para ilustrar o ponto: "Imagina ter tropas russas e chinesas na divisa com a costa leste dos Estados Unidos, ameaçando cidades como Nova York, Boston, Filadélfia, Chicago, a própria capital, Washington."

Lívio também enfatizou que a única maneira de se alcançar uma resolução duradoura para o conflito seria a adoção da neutralidade por parte da Ucrânia.

"Por isso que, de todas as maneiras de discutir o fim do conflito, enquanto não contemplar a renúncia da Ucrânia em entrar na aliança, enquanto não contemplar a neutralidade ucraniana, essas negociações vão ser totalmente infrutíferas", afirmou, deixando claro que esse ponto é decisivo para Moscou.

Ele também apontou que não se trata apenas de uma questão territorial, mas de uma mudança na ordem de segurança europeia e atlântica, algo que é "sensível não apenas ao [presidente russo, Vladimir] Putin, mas aos líderes de outros países, principalmente os emergentes, como os chineses, os indianos, os brasileiros".

Em relação ao impacto das sanções impostas à Rússia, Lívio observou que a resistência da Rússia a essas sanções foi em grande parte possível devido à manutenção de laços comerciais importantes com países do "Sul Global", como Brasil, China e Índia.

"Hoje, a participação dos países emergentes e em desenvolvimento no comércio global, na produção de riqueza global, é uma parcela muito maior do que, por exemplo, há 25 anos", afirmou. O especialista destacou como essa mudança estrutural no mercado global enfraqueceu a eficácia das sanções, já que a Rússia conseguiu encontrar novos parceiros comerciais fora da esfera de influência ocidental.

Para Lívio, ao optarem por uma abordagem multilateral, os países do Sul Global "preferem manter um canal aberto tanto com os europeus e americanos, mas também manter suas relações com Moscou, Pequim, Nova Deli etc."

Por último, ele comentou a importância do novo ramal do gasoduto "Força da Sibéria", que agora não só leva gás à China, mas também passa pela Mongólia, "ampliando a integração energética não só com a China, mas também com um país intermediário que, embora não tenha a pujança econômica dos seus vizinhos, experimenta crescimento e é uma democracia liberal".