Equador será 'laboratório' dos EUA para expandirem sua segurança nacional na América Latina

O governo equatoriano confirmou que os EUA estão analisando possíveis locais para instalar bases de Segurança Nacional no país com caráter civil. Especialistas consultados pela Sputnik apontaram as controvérsias dessa possibilidade de consolidação de um "polo de segurança no Pacífico".
Embora o presidente do Equador, Daniel Noboa, tenha que aguardar até 16 de novembro para saber se os equatorianos aprovam a instalação de bases militares estrangeiras no país, o governo informou que "nas próximas semanas" a secretária de Segurança Nacional dos EUA, Kristi Noem, chegará ao Equador com o objetivo de "definir já a localização das bases" de sua pasta no país.
A novidade é que essa cooperação não seria com unidades do Pentágono, mas sim com o Departamento de Segurança Nacional (DHS).
O órgão dos Estados Unidos foi criado após os atentados de 11 de setembro de 2001, em Nova York, com o objetivo de coordenar todas as entidades e agências norte-americanas dedicadas à segurança interna.
Atualmente, reúne 22 departamentos e agências federais, dentre eles, a Guarda Costeira, o Departamento de Alfândega e Proteção de Fronteiras, o Serviço Secreto, o Escritório de Inteligência e Análise, e o Serviço de Imigração e Controle de Alfândega.
"Nossas funções são muito diversas e nosso objetivo é claro: manter os EUA seguros", afirma a própria secretaria, destacando que suas atividades "vão desde segurança aérea e de fronteira até resposta a emergências, de analistas de cibersegurança a inspetores de instalações químicas".
Ainda assim, a possibilidade de instalar escritórios fora do território dos EUA surge como uma novidade para o órgão, que teria no Equador suas primeiras unidades além das fronteiras.
"A novidade desse tipo de base é que são menores do que as bases militares tradicionais, mas funcionam em rede, aproveitando a infraestrutura militar e de segurança local", explicou à Sputnik a mestre em Estudos Latino-Americanos e integrante do Observatório do Lawfare argentina Tamara Lajtman.
A acadêmica relacionou esse tipo de instalação com os chamados Forward Operating Locations (FOL, ou Locais de Operações Avançadas), como os existentes em El Salvador ou Curaçao. No entanto, essas instalações são de caráter militar e administradas pelo Pentágono por meio do Comando Sul. O que foi anunciado para o Equador teria por enquanto caráter civil e estaria sob responsabilidade do Departamento de Segurança Nacional.
Em entrevista a Sputnik, o analista político Decio Machado alertou que se trata de um órgão do governo norte-americano "que, nas últimas duas décadas, assumiu um poder imenso" dentro da estrutura estatal dos EUA.
Trabalhos de inteligência?
Machado afirmou que o aumento das atribuições do órgão o transformou, atualmente, "na agência de segurança com o maior número de violações aos direitos civis nos EUA", segundo dados de próprios organismos norte-americanos.
Segundo ele, as denúncias estão relacionadas a "atividades de espionagem, interceptação de comunicações e, inclusive, falsas acusações contra líderes de movimentos sociais e organizações civis" por parte da entidade.
"Isso é alarmante, porque parece que, sob o pretexto de combater o narcotráfico com o apoio do Departamento de Segurança dos EUA, na verdade estão sendo implantados mecanismos de controle sobre as dissidências políticas", opinou o especialista.
Para Machado, é possível que o governo de Noboa esteja interessado em aproveitar essa colaboração com os EUA para realizar "monitoramento de líderes políticos da oposição". Por outro lado, ele sugeriu que Washington pode usar essa aproximação como um teste para implantar iniciativas semelhantes em outros países da região.
"Isso seria um experimento, um laboratório para fazer o mesmo em outros países latino-americanos", enfatizou, mencionando a possibilidade de acordos similares com governos aliados, como o da Argentina.
Um "polo de segurança" no Pacífico
Para Lajtman, não se deve perder de vista o crescente interesse dos EUA em se estabelecer nas Ilhas Galápagos, administradas pelo Equador, consideradas de grande relevância geopolítica devido à sua localização estratégica no Oceano Pacífico.
A especialista recordou a visita do embaixador dos EUA no Equador, Art Brown, ao arquipélago em março de 2025, que salientou a importância de fazer acordos de cooperação em segurança — alguns meses após o Conselho de Governo das Galápagos ter aprovado, pela primeira vez, a entrada de navios de guerra norte-americanos nas ilhas, sob a justificativa de combate ao narcotráfico.
Embora o interesse de Washington pelas ilhas seja antigo, Lajtman destacou que elas adquirem agora "relevância renovada" no contexto da disputa geopolítica com a China.
Segundo ela, o arquipélago pode ter tanto uma função de "defesa hemisférica" — com foco no Canal do Panamá, no corredor transístmico ou no Porto de Chancay, no Peru — como uma função "ofensiva" de vigilância e controle das rotas marítimas rumo ao Pacífico Sul.
Nesse cenário, Lajtman considerou que tanto as possíveis bases militares tradicionais quanto a rede de escritórios do Departamento de Segurança dos EUA podem fazer parte de um projeto americano de "criar um polo de segurança no Pacífico".