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Bares de São Paulo sentem impacto do medo do metanol e mudam cardápio

Publicado em 03/10/2025 às 22:26
© Sputnik Brasil / Guilherme Correia

Na noite desta sexta-feira (3), o cenário em uma das vias movimentadas e boêmias da Vila Mariana, a Avenida Conselheiro Rodrigues Alves, destoava do habitual. Pouco depois das 20h00, cadeiras vazias e garçons parados revelavam um movimento bem abaixo do esperado para o primeiro "sextou" após a divulgação dos casos de intoxicação por metanol.

Além de São Paulo, foram registrados casos em outras 29 cidades do país, de acordo com dados do Ministério da Saúde. Durante cerca de uma hora, a reportagem observou a rotina dos bares no local e constatou que o fluxo de clientes estava menor do que o normal para o horário. O contraste com semanas anteriores foi evidente: havia silêncio onde, normalmente, a agitação de mesas lotadas é regra.

Um proprietário ouvido pela Sputnik Brasil contou que o Comandante Bar precisou alterar o cardápio para se adaptar ao momento. No aniversário de um grupo de cerca de 20 pessoas, apenas um drink sem álcool foi consumido. "O resto pediu cerveja", relatou. Para ele, a retração do público lembra uma espécie de "pandemia do metanol", expressão usada para descrever o impacto da crise no setor.

Esse cenário não se restringe à Vila Mariana, na região do Largo da Batata, em Pinheiros, também encontravam-se com menos frequentadores do que o normal para o horário. Em geral, os proprietários entendem que é preciso aguardar o desenrolar das investigações para poder retornar a comprar tais produtos e produzir drinks.

Para além dos bares, no Sesc Pompéia e em outras unidades, o estabelecimento alterou seu cardápio para evitar o uso de bebidas destiladas até haver maior segurança no fornecimento.

Por outro lado, bares da República e Higienópolis seguem lotados — mas com uma priorização quase que geral da cerveja, ao invés de outras bebidas alcóolicas.

Segundo dados divulgados pelo Ministério da Saúde, ao todo já foram notificadas 113 intoxicações por metanol em todo o Brasil — 11 confirmadas e 102 em investigação — e São Paulo responde por 101 dessas notificações, sendo 11 confirmadas e 90 em investigação.

No estado, operações da vigilância sanitária resultaram na interdição de três bares, com apreensão de mais de 800 garrafas sem procedência.

As autoridades também instalaram uma sala de situação para monitoramento dos casos e reforçaram mobilização entre órgãos de saúde e segurança.

Associações do setor também entraram em campo. A Associação Brasileira de Bares e Restaurantes de São Paulo (Abrasel-SP) divulgou nota orientando que os estabelecimentos comprem bebidas exclusivamente de distribuidores confiáveis e descartem embalagens de forma segura, quebrando as garrafas de vidro para evitar o reuso. "Estamos diante de uma questão de saúde pública e de preservação da imagem do setor", destacou Gabriel Pinheiro, diretor da entidade.

A Associação de Bares e Baladas de São Paulo (Apressa) também se posicionou. Em comunicado, disse acompanhar "com extrema atenção e preocupação" a escalada de falsificação e recomendou que os bares não comprem bebidas de canais paralelos nem tomem o preço como único critério. A entidade reforçou que segue à disposição para colaborar com o poder público em medidas de fiscalização e prevenção.

O governo paulista ainda não esclareceu se o risco está restrito apenas a destilados nem informou quais marcas foram adulteradas. Além disso, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) afirmou que não há evidências de que o crime organizado, por meio do Primeiro Comando da Capital (PCC), tenha sido responsável pelo esquema de bebidas adulteradas, o que diverge da principal linha de investigação da Polícia Federal (PF).

O que é metanol e para que serve?

O metanol, substância usada em solventes e combustíveis, é altamente tóxico e não pode ser ingerido. Em bebidas adulteradas, ele é usado como substituto ilegal do etanol, cortando custos de produção. Pequenas quantidades já podem causar efeitos graves, como náuseas, perda de visão e até morte.

O risco se concentra principalmente em destilados adulterados, como vodca, uísque e gin, mas autoridades reforçam que ainda não há clareza sobre quais marcas ou lotes foram contaminados.

A identificação de uma possível intoxicação não é imediata. Os sintomas costumam aparecer entre 12 e 24 horas após o consumo, o que atrapalha o diagnóstico precoce. Além do mal-estar geral, um sinal de alerta importante é a alteração visual, que pode começar com visão borrada e evoluir rapidamente.

Quem apresentar esses sintomas depois de ingerir bebida alcoólica deve procurar atendimento médico de urgência. O tratamento envolve o uso de antídotos, como etanol farmacêutico ou fomepizol, além de hemodiálise em casos mais graves, para remover a substância do organismo.

Para reduzir os riscos, o Ministério da Saúde e especialistas recomendam evitar o consumo de bebidas sem procedência clara, especialmente as destiladas, até que a situação seja melhor esclarecida.


Por Sputinik Brasil