Uma década do surto de Zika no Brasil: cicatrizes, avanços e novos desafios
Dez anos após o surto que mobilizou o país e o mundo, o vírus Zika ainda deixa marcas profundas na saúde pública brasileira. Em 2015, o país viveu um dos momentos mais críticos de sua história sanitária, quando o aumento repentino de casos de microcefalia em recém-nascidos, principalmente no Nordeste, levou o Ministério da Saúde a declarar emergência nacional. Pouco depois, em 2016, a Organização Mundial da Saúde (OMS) também reconheceu a gravidade do cenário e decretou emergência internacional.
O vírus, transmitido pelo mosquito Aedes aegypti, expôs fragilidades na estrutura de vigilância epidemiológica e na resposta do sistema de saúde. A relação entre o Zika e a Síndrome Congênita do Zika (SCZ) — que causa malformações cerebrais e neurológicas graves em bebês — transformou a crise em uma tragédia social e humanitária. Desde então, milhares de famílias convivem com as sequelas e lutam por acesso contínuo a terapias, atendimento especializado e inclusão social.
Estudos da Fiocruz indicam que entre 2015 e 2023 mais de 22 mil casos suspeitos de infecção congênita foram notificados no país, e cerca de 3.800 confirmados. A maioria foi registrada na região Nordeste, onde as condições socioeconômicas e estruturais agravaram o impacto da epidemia. A resposta científica, por outro lado, avançou rapidamente. Pesquisadores brasileiros identificaram o mecanismo de ação do vírus no sistema nervoso fetal, desenvolveram novos testes de diagnóstico e criaram protocolos de acompanhamento para gestantes e crianças afetadas.
Apesar da redução drástica de casos após 2017, o Zika continua circulando de forma esporádica no Brasil. Especialistas alertam que uma nova cepa, de origem africana, pode representar risco de reemergência, especialmente diante da queda na vigilância e dos efeitos das mudanças climáticas, que ampliam a área de atuação do mosquito transmissor.
Dez anos depois, as cicatrizes deixadas pela epidemia ainda exigem respostas. Famílias continuam enfrentando desafios para garantir cuidados e terapias de longo prazo, e o país precisa manter o compromisso com a ciência, a vigilância e a inclusão social. A epidemia de Zika deixou uma lição clara: emergências em saúde não se encerram quando as estatísticas diminuem — é preciso sustentar políticas públicas e apoio contínuo para que os impactos não se tornem permanentes.